Recentemente, fui levado a refletir sobre a questão da identidade de uma pessoa depois de ouvir a apresentação de uma professora da universidade que começou assim: “Bom dia! Eu sou ‘Fulana’ professora de ‘tal matéria’”. Nada mais comum, não é? Mas, será que aquela docente “era” aquilo que fazia, era o que ensinava?
Bem, lendo Veja (Edição 1952 – 19/04/2006) nas páginas amarelas, deparei-me com o Dr. Bernard Devauchelle, médico francês, chefe da equipe que fez o primeiro transplante de face da história em Isabelle Dinoire.
Segundo ele, “O rosto ainda é um componente importante para identificar um indivíduo, mas acredito que, pouco a pouco, estamos passando da época da antropometria para a época da genética. Em outras palavras, temos uma identidade pela face, mas ao mesmo tempo temos uma verdadeira identidade no plano genético. No entanto, em termos de transplante essa questão de identidade não se coloca, porque não não há semelhança com o rosto da doadora nem com o da receptora”.
O que é alguém? O que faz alguém ter determinada identidade e não outra? O que é, afinal, a identidade de alguém?
Identidade é algo que singulariza alguém na perspectiva do outro. Eu sou quem eu sou porque eu não sou ninguém mais. Portanto, não existe identidade sem o outro.
Mas, será que o que sou é a minha identidade? Ou eu tenho múltiplas identidades? Sou alguém em casa como marido e pai, outro na igreja em que sirvo como pastor, outro na universidade como estudante e assim por diante, ou sou somente um, independentemente de onde, de quando e de com quem estou, como desejam os que pugnam pela utópica autenticidade absoluta?
Tal reflexão nos leva, inexoravelmente, à conclusão de que eu não sou, eu estou sendo alguém, isto é, a condição de essência – ser – não me pertence como uma “metamorfose ambulante”, para usar o termo de Raul Seixas. Sou transitório. Estou. Existo no tempo e no espaço.
É exatamente esta conclusão estonteante que os hebreus entenderam movidos pela realidade teológica do Deus que se revelara como o “EU SOU O QUE SOU”, conforme ouviu Moisés no seu chamado à libertação em meio a uma sarça ardente no deserto de Mídia.
Porque Deus é o único que é, todos estão. Ele é a única imutável essência. Ele é, independentemente de onde, quando e com quem está. Em termos filosóficos, “Ele é o Motor Imóvel que a tudo move”.
No dia de hoje, ter a minha identidade definida pelo Grande Outro, me traz desafios e possibilidades. Sou desafiado à humildade pela infinita grandeza e riqueza dAquele que é e também dos que, como eu, estão em transição. Sou desafiado à gratidão por poder usufruir de alguma singularidade e não ser apenas parte de um todo que me envolve.
Mas, também sinto que a alegria por não me sentir preso a uma coerência impossível, porque a mudança é possível e desejável, pois posso e preciso mudar. Sei que é possível exercer meus múltiplos papéis que me identificam como ser em situação, existindo para outros e não para mim, ensimesmado e egoísta.
Então, da próxima vez que nos encontramos, permita apresentar-me: “Eu estou Robinson!”
Robinson